quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Crazy Little Thing Called Love, in Paris



"Ama-me menos,
mas me ame por muito tempo".


No fundo, eu sou um sentimental. Desde pequeno que eu sempre fico paralisado a ver filmes assim, um tanto quanto românticos, apesar de dizer, numa conversa há poucos dias com um amigo meu, que não consigo mais ver os romances água-com-açúcar hollywoodianos, daqueles estrelados pela Meg Ryan, sabe quais são? Então. Mas se passa Cidade dos Anjos eu páro o que estiver fazendo. Logo, sou uma contradição. Até mesmo em expôr sentimentos: por fora sou reservado, fechado para demonstrar afeto, como bom descendente de alemães. Mas há uma mistura de paixão espanhola com o sentimento forte italiano. Herança do Sampaio (espanhol) Oliveira (português, que nada tem a ver com a história) que tá na minha certidão de nascimento.

Disse tudo isso porque hoje, em minha folga de meio-de-semana, eu resolvi botar a rodar no DVD um filme que me foi enviado, pelo correio, pelo sábio Renato, grande pessoa. Eu estive uma semana inteira sem ter tempo nem pra respirar direito, tendo que trabalhar de dia e me virando em reuniões à noite, tentando convencer os candidatos a prefeito daqui a investirem mais na cultura, cinematográfica e teatral. Sendo assim, somente hoje pude conferir o que continha aquele DVD. E, uma hora e meia depois, me sento em frente a este computador. Para falar um pouco do filme, mas para falar de amor também. Culpem Canções de Amor, filme francês dirigido por Christophe Honoré, e que agora figura entre meus musicais favoritos.

Não há como explicar a história sem passar um pouco de spoiler, que você, que lê meu texto agora, me perdoe: tudo começa com um menàge a trois em Paris.

Espere. Tempo.

O sonho de qualquer polígamo é ter um menàge a trois em Paris. Cidade propícia a namorados e a [des]amores. Paris é a cidade-modelo, a cidade fotogenia, fica bem até em filme pornô. Não tem sujeira, não tem nada que fique feio na tela. Até o mendigo, que dorme ao relento, fica bonito nas ruas de Paris. Pronto, falei.

Então. Acontece que, desse triângulo amoroso, uma das partes (é um rapaz e duas moças), uma das moças acaba tendo uma morte súbita. E o filme parte daquela coisa de como lidar com o sentimento de perda e reencontrar o amor. Como diz uma personagem do filme, "cada um lida com a dor à sua maneira". E é. Principalmente quando se trata de assuntos do coração. O amor pode ser a coisa mais bonita do mundo, mas é a mais perigosa, visto que um romance pode dilacerar qualquer bom sentimento que more na alma de alguém. O amor pode destruir, o amor pode acabar com os sonhos e a perspectiva de um bom futuro. Ao mesmo tempo em que pode ser uma coisa maravilhosa, uma coisa linda, uma coisa ótima. No caso aqui, Ismael - esse é o nome do rapaz - acaba encontrando um outro rapaz, gay, e a partir daí sua vida começa a tomar outro rumo, mesmo tendo contato com a família da falecida namorada e com a outra, a terceira parte do triângulo.

Dividido em três momentos ("A Partida", "A Ausência", "O Regresso"), Honoré conseguiu fazer aqui um musical perfeito. Ah, esqueci de informar a quem não sabe, o filme é um musical, com maravilhosas músicas compostas por Alex Beaupain, vale procurar na internet) e com um ar que lembra muito a nouvelle vague. Fora a coragem de expôr temas tão díspares (poligamia, relacionamentos homossexuais e bissexuais, etc) com uma leveza de espírito que nem o mais recatado conservador resiste. E é concebido com poesia pelo diretor Honoré, que usa com sabedoria as paisagens naturalmente cinematográficas da cidade-luz, com a ajuda, claro, do diretor de fotografia Rémy Chevrin, que faz um trabalho acinzentado e nebuloso, como pede o enredo. É bonito e pronto.

Não há, em Canções de Amor, um momento em que você não acredite na verdade das situações. Muita gente se pergunta: "É possível amar duas pessoas ao mesmo tempo?" ou "Será que alguém, hétero, pode sentir atração, um dia, por um homem?". Nesse filme, essas perguntas, carregadas de preconceito embutido, não existem; assim como na vida. Porque no coração ninguém manda, as coisas acontecem e fluem naturalmente, sem forçar. E essa é a beleza do filme em questão, pois acreditamos que todas aquelas cenas poderiam estar acontecendo ali, na casa do vizinho. Ou mesmo no quarto ao lado. Por que não?

E, claro, um filme falado e cantado em francês tem seus encantos, é quase impossível resistir. Fazia um tempo que eu não via cinema francês, o último que tinha visto foi Medos Privados em Lugares Públicos (de Alain Resnais, e é um porre). Foi uma grata surpresa ter recebido esse DVD em casa, ainda mais no momento delicado que venho enfrentando na vida pessoal; e, para me ajudar até nisso, a frase-ícone do filme virou o epípeto desse meu texto.

E, só pra encerrar, Canções de Amor me fez ver que não há coisa mais bonita, coisa mais louca e mais bela do que esse coisinha doida chamada amor, que mais parece uma reação alérgica: ao sentir pela primeira vez, você sabe que vai passar por aquilo pelo resto da vida, querendo ou não.

Canções de Amor
(Les Chansons D'Amour)
Musical, 2007
Roteiro e direção de Christophe Honoré
Elenco: Louis Garrel, Ludvine Sagnier, Chiara Mastroianni, Clotilde Hesme, Gregóire Leprince-Ringuet
Música e Letras de Alex Beaupain
Direção de Fotografia por Rémy Chevrin

Montagem por Chantal Hymans

5 comentários:

Renato disse...

é ^^
acho que vou até assistir de novo ha/

Pedro Henrique Gomes disse...

Bela crítica. Não vi o filme mas fiquei curioso. Abraço!!!

Anônimo disse...

Me empolgou. Alias, Willian do Eco Social o elogiou muito também recentemente. Tô intrigado.

Ciao!

Rodrigo disse...

Eu tô querendo muito ver esse desde que eu assisti ao anterior do Honoré, Em Paris, que é muito bom. E também porque eu sou completamente apaixonado pelas duas atrizes desse filme, a Sagnier e a Hesme.

E, que é isso, Medos Privados é excelente! hehehe. :P

Miriam disse...

Gostei da dica vou vê-lo e também vou falar para a minha irmã que tem um blog de trilha sonora de filmes e partituras musicais. Parece que as músicas são muito boas.
Beijos.